quinta-feira, 14 de junho de 2012

A Sociedade Invisível

"O pior inimigo da crítica é a própria crítica,quando mal realizada e concebida com pouco sentido crítico.Opor-se por princípio à opinião dominante e agir sempre e sem excepção contra o estabelecido pressupõe dar excessivo valor à opinião dominante e ao estabelecido,prestar-lhes uma involuntária homenagem que provavelmente não merecem.Equivale a claudicar perante o seu império,a instalar um automatismo.Na origem de muitos estereótipos contestários não há mais que a falta de reflexão e de diferenciação.Isto empobrece a crítica porque diminui a capacidade de aprender.Pode estar aqui uma das explicações da tremenda penúria com que a crítica é formulada na sociedade actual e da escassa rivalidade oposta aos poderosos.O sistema aprende melhor que os seus críticos.
Os sistemas tornam-se imunes à crítica assumindo-a.Para o poder,nada há melhor para neutralizar uma rebelião que pôr-se ao seu lado.Quem hoje se manifestar contra alguém tem de contar que os destinatários do protesto se declarem solidários com ele.Poderíamos afirmar que o poder de um sistema está completo quando consegue introduzir a negação do sistema no próprio sistema.A nossa sociedade deve a sua flexibilidade aos críticos,que já nada pôem em perigo.Os meios de comunicação cuidam do desvio e alimentam a inquietação da sociedade,isto é: a sua disposição para o conformismo.Deste modo,quando a subversão é a corrente dominante,o mainstream,podemos encontrar revolucionários a nadar no sentido da corrente,pessoas que falam nos meios de comunicação contra os meios de comunicação,rotinas apresentadas como rupturas com a tradição e protestos que apenas satisfazem o gozo da indignação.O underground foi introduzido no mainstream.A economia é encenada eticamente;o marketing alia-se à subcultura;a crítica social é subvencionada por instituições que deviam tremer perante a crítica...Todos estes fenómenos têm a mesma estrutura: a negação do sistema está introduzida no próprio sistema,que deste modo se tornou inatacável."

Daniel Innerarity in A sociedade Invisível (Cap 2- Um Olhar Crítico à Sociedade Contemporânea)

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